Por Derick Azevedo

 

Recentemente a Oxfam, famosa confederação internacional presente em mais de 90 países, divulgou um relatório econômico denunciando o crescimento da disparidade de renda no mundo, bem como uma pesquisa apontando que segundo a percepção da maior parte da população “o capitalismo faz mais mal do que bem”.  O principal dado apresentado pela entidade é o de que as 26 pessoas mais ricas do mundo têm um patrimônio equivalente aos 3,4 bilhões mais pobres do planeta.

Este mesmo relatório aponta como solução mágica para a resolução dos problemas sociais, da pobreza, saúde e educação, o aumento da tributação sobre os mais ricos e o uso destes recursos em programas de assistencialismo e redistribuição de renda. O discurso anticapitalista da Oxfam corrobora com as pautas dos ditos “justiceiros sociais” que acreditam que o mercado e o capitalismo naturalmente tendem a concentrar a riqueza nas mãos de poucos enquanto a maior parte da população seria explorada e jogada na miséria. Portanto é necessária uma quebra com esse sistema supostamente ineficiente e com a ideia de indivíduo racional, que age conforme seu auto interesse.

Um dos maiores erros na análise dos problemas sociais contemporâneos feitos por intelectuais e entidades ligadas a pensamentos de esquerda e socialistas é o de apontar a desigualdade como o maior problema da sociedade e que ela deve ser o primeiro mal a ser combatido. Tal crença parte da premissa marxista que as desigualdades são fruto da exploração de uma classe ou grupo sobre outro e que as diferenças entre indivíduos são uma falha na natureza humana. Entretanto, uma análise praxiológica e moral de como o indivíduo age e dos frutos da desigualdade, bem como a observação dos resultados práticos do capitalismo e da liberdade econômica mostram uma realidade totalmente diferente da defendida pelo “igualitaristas”.

É um fato que ainda existem milhões de pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade econômica ou na miséria e que parte da população mundial não tem acesso a educação ou saúde. Faz-se necessário analisar as causas dessa situação, reconhecer os avanços históricos nessas áreas e focar nossos esforços na resolução do problema principal, a pobreza. 

Primeiramente é importante frisar que a desigualdade em si não é um problema, ao contrário do que o senso comum nos leva a pensar. O fato de alguns indivíduos obterem um sucesso financeiro muito maior que outros é perfeitamente natural, desejado e pode ser explicado com as teses de dois escoceses do século XIX, David Hume, Adam Smith.

Segundo Hume em sua Magnum opus “Tratado sobre a natureza humana” a vida em sociedade e as trocas entre indivíduos surgiram primeiramente da necessidade de alocar e de multiplicar, por meio do aumento de produtividade, os recursos escassos ofertados pela natureza ao homem. Assim, nossos antepassados distantes foram desenvolvendo, pelo processo de mercado, demandas diferentes e sistemas de produção cada vez mais complexos e eficientes. Pela própria natureza humana de buscar sempre as formas mais vantajosas de sobrevivência e satisfação das necessidades, a vida em sociedade se tornou algo imprescindível para a civilização, bem como as leis de segurança a vida e a propriedade que garantem que esse desenvolvimento não seja interrompido. No meio de todo esse processo, obviamente que aqueles indivíduos que tomarem decisões que levem a uma geração maior de valor ou que despendam maior esforço e tempo na sua atividade produtiva obterão a longo prazo um acúmulo de capital maior. Logo, terão a possibilidade de possuir mais bens e propriedades e, assim, a sociedade, de forma natural, se torna desigual. David Hume também ressaltava que como antes do desenvolvimento das civilizações e dos sistemas amplos de comércio o homem vivia em tribos primitivas onde todos os recursos obtidos pelo grupo eram divididos igualmente entre os integrantes, a mudança de paradigma para um sistema de trocas onde alguns homens auferiam, por seu trabalho, mais recursos que outros despertou a sentimento de inveja e ressentimento nos que obtinham menos sucesso (uma das razões psicológicas que mais tarde levaram à popularização do socialismo e demais ideologias igualitaristas).

Outra consequência natural da ação humana propositada em busca do auto interesse, como postulado pela praxiologia de Mises e anteriormente descrita por Adam Smith na “Riqueza das Nações” é a de que o indivíduo, mesmo agindo pelo seu egoísmo (como a pura busca pelo lucro), acaba beneficiando os demais membros da sociedade. 

Vamos supor que Inácio, que tem um bom capital guardado, deseja abrir um mercado, pois acredita que conseguirá uma rentabilidade maior do que as aplicações em que seu dinheiro estava anteriormente. Inácio então procura um lugar na cidade onde não haja concorrentes próximos e assim ganhe uma vantagem geográfica. Além disso, ele compra os produtos para serem vendidos em seu empreendimento e contrata pessoas para o caixa, gerência e demais funções para o funcionamento de seu mercado. Para poder angariar clientes e vencer sua concorrência ele tem de fazer promoções para captar consumidores e auferir o maior lucro possível. No processo descrito, Inácio agiu de forma racional buscando apenas o seu lucro. Entretanto, ele acabou por beneficiar muitas pessoas direta ou indiretamente: os moradores daquela região agora precisam se deslocar menos para fazerem as compras, os clientes do mercado terão acesso a maior variedade de produtos e preços, os contratados ganharam uma oportunidade de emprego e renda, os fornecedores do mercado agora têm mais um novo cliente e o capital que está circulando na economia pode possibilitar muitas outras coisas as quais nosso conhecimento limitado não pode mensurar ou conhecer. 

Esse empreendimento de Inácio é um exemplo do funcionamento do capitalismo e como ele está presente na vida de todos nós. O dinamismo descrito só é possível se os agentes envolvidos no procedimento têm a liberdade de escolha, associação e de contrato. No momento em que um ente externo (o Estado) impõe barreiras como burocracias, regulações, taxas e encargos, o processo de mercado fica prejudicado e todos acabam perdendo parte do benefício que teriam se a relação fosse feita em um ambiente com as leis de vida, liberdade e propriedade. Obviamente o empreendedor (Inácio), se obter sucesso, sairá com um lucro maior do que seus funcionários, criando uma evidente desigualdade econômica. Porém, todos estes últimos tiveram uma melhora financeira em relação ao seu estado anterior.

Muitos políticos, organizações e jovens “justiceiros sociais” (geralmente dotados de boas intenções), em sua tentativa de tornar a sociedade economicamente homogênea, acabam por destruir os mecanismos de criação de riqueza e progresso social. Ao elevar os gastos do Estado, eleva-se a tributação. Ao criar programas assistencialistas e de redistribuição de renda, diminui-se os incentivos ao esforço e a recompensa da geração de valor. O aumento do poder dos governos e a expansão do escopo regulatório leva à diminuição das liberdades individuais e dos direitos de propriedade privada. No fim, o objetivo da igualdade acaba ficando mais próximo, mas o nível de renda e a qualidade de vida da população fica igualmente menor. Tanto ricos quanto pobres perdem com esse processo, com exceção dos membros do Estado e seus aliados.

É possível desfazer facilmente a lógica da igualdade, com dois exemplos: um teórico e outro empírico.

Imagine que João e Pedro tenham salários de respectivamente R$ 1200 e R$ 2000, a desigualdade entre suas rendas é de R$800. Um certo dia ambos recebem um aumento de 50% em sua remuneração mensal e assim João passa a ganhar R$ 1800 e Pedro $3000. Ambos melhoram financeiramente, mas a diferença entre seus ganhos pula para R$ 1200. Pela lógica dos igualitaristas, João está no prejuízo! Um evidente erro.

O coeficiente de Gini, que mede a relação entre a renda dos 20% mais ricos e os 20% mais pobres de um país, é um dos principais indicadores de desigualdade econômica. Em uma escala de 0,00 a 1,00 quanto menor o índice, mais igualitário é o país. 

Agora observe dois grupos de países com diferentes coeficientes de Gini, medidos pelo Banco Mundial.

Grupo A –  EUA (0,40), Reino Unido (0,32), Hong Kong (0,43) e Nova Zelândia (0,36)

Grupo B – Afeganistão (0,27), Albânia (0.29), Iraque (0,29) e Timor Leste (0,28)

Existem muitas diferenças entre os países dos dois grupos. As nações do agrupamento A são mais livre economicamente e socialmente, muito mais ricas e mais desiguais. Já as nações do grupo B possuem economias mais planificadas, são muito mais pobres e menos desiguais. Isso não significa, porém, que não existam países mais igualitários e ricos (como Finlândia e Holanda) e nem que não se encontre países desiguais e pobres (como Nigéria e Brasil). O problema não está na desigualdade de renda e sim em como o sistema econômico e a estrutura de Estado influenciam nas diferenças entre indivíduos. 

Como já explicado, um processo de livre mercado pode formar disparidades de renda causadas por diferentes decisões e habilidades dos agentes da sociedade: uma desigualdade de riquezas, ética e saudável. Contudo, quando as diferenças naturais da sociedade são incentivadas ou acentuadas por intervenções de governos na economia, a desigualdade torna-se uma consequência de uma estrutura e legislação injustas, que dificultam a ascensão social dos mais pobres em benefício de uma oligarquia política e econômica.

Tomemos o Brasil como Exemplo: temos um país onde o governo toma para si a função de gerar riqueza (o que é impossível por definição), conduzir as atividades econômicas, regular vários setores, proteger o consumidor dele mesmo e impor burocracias e leis que tolhem a liberdade de associação, assim resultando em uma baixa produtividade e subdesenvolvimento. Políticas públicas como subsídios a empresas “estratégicas”, privilégios e altos salários para o funcionalismo público, sistema previdenciário por repartição, protecionismo, universidade “gratuita” para alunos ricos e diversas concessões como meia entrada para estudantes, tudo custeado por uma grande malha de impostos que atinge, sobretudo, as camadas menos abastadas e fazem com que nosso país seja um dos mais desiguais do mundo, uma desigualdade nada natural e nem saudável.

Os exemplos de desigualdade extrema, como o brasileiro, são encontrados por via de regra em países onde o sistema econômico histórico tem forte viés anticapitalista. A resolução dos problemas sociais que ainda atingem o mundo passa por reconhecer os meios que trouxeram o progresso para uma humanidade anteriormente miserável.  

Em 1800, no início da revolução industrial e da ascensão das ideias liberais, cerca de 95% da população mundial vivia na extrema pobreza. Hoje, com o mundo globalizado e com o avanço do capitalismo, “apenas” 10% dos habitantes do planeta encontram-se nessa situação.

Desde 1990, vivemos no que a própria Oxfam chama de a “era do neoliberalismo”.  Segundo o Banco Mundial, neste período a fome, a miséria, o analfabetismo e a mortalidade infantil caíram mais de 50%. Estudos recentes apontam que a globalização, abertura comercial, aumento da participação da iniciativa privada na economia, simplificação de regulações e a maior liberdade de contrato promovem uma maior produtividade econômica logo aumentam o padrão de vida e renda dos países. Apesar de já estar se tornando repetitivo, é sempre importante relembrar que nações mais livres (pelos rankings de liberdade econômica), são quase que invariavelmente as nações em que a mobilidade social e a renda dos mais pobres é maior.

Segundo pesquisa feita pelo Fraser Institute em 2018, com dados do Banco Mundial, a renda anual dos 10% mais pobres no quartil dos países mais livres é de aproximadamente U$ 10.600, enquanto que no quartil dos países menos livres ela não passa de U$1.345.

O capitalismo possibilita que haja, parafraseando Mises, “produção em massa para a massa”. A oferta de bens e serviços que são valorizados pelos consumidores e úteis para suas vidas é recompensada pelo lucro e os benefícios são divididos com a sociedade, mesmo sem que essa seja a intenção do empreendedor. Um estudo feito e publicado pelo economista William Nordhaus em 2004 estima que os empreendedores capturam apenas 2,2% do valor que geram. O restante fica para a população, direta ou indiretamente. 

Jeff Bezos, dono da Amazon, e um dos homens mais ricos do mundo, certamente contribuiu muito para o progresso social, possibilitando trocas de bens entre indivíduos com um frete barato e pequena margem de lucro. Mark Zuckerberg ofereceu aos usuários do Facebook a oportunidade de se conectarem com milhões de outros indivíduos, trocar ideias, formar amizades e anunciar seus serviços e produtos. O valor gerado por essa plataforma é imensurável e certamente maior do que o patrimônio do CEO da maior rede social do planeta.

Se a Oxfam e as demais entidades e pessoas preocupadas com a desigualdade realmente desejam melhores condições econômicas para os menos abastados, deveriam então defender a liberdade econômica (o capitalismo) como ambiente fértil para o enriquecimento da população como um todo. Combater a desigualdade econômica por meio do Estado não é natural, moral, eficiente e tampouco saudável.

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